8.12.10

O 25 de Novembro de 1975 / Breve reflexão

O 25 de Novembro de 1975

O 25 de Novembro de 1975 foi um golpe militar que pôs fim à influência da esquerda militar radical no período revolucionário iniciado em Portugal com o 25 de Abril de 74. Esta acção militar constituiu uma resposta à resolução do Conselho da Revolução (órgão que representava o Movimento das Forças Armadas – MFA, tendo funcionamento permanente até esta data e que, então, passou a dividir poderes com o governo) de desmantelar a base aérea de Tancos e de substituir alguns comandantes militares.

O confronto militar deu-se entre duas partes, de um lado, o PS, o centro e a direita com o Grupo dos Nove e os Comandos e, do outro, o PCP, alguns partidos de extrema-esquerda, a esquerda militar gonçalvista e a esquerda militar otelista (Vasco Gonçalves; Otelo Saraiva de Carvalho).

Nessa data, sectores da esquerda radical – essencialmente pára-quedistas e polícia militar na Região Militar de Lisboa –, provocados pelas notícias, levam a cabo uma tentativa de golpe de estado, que no entanto não tem nenhuma liderança clara. Esses partidários do designado "Poder Popular" ocupam então várias bases militares, bem como meios de comunicação social – foi decretado o estado de sítio em Lisboa pelo Presidente da República.

A reacção da outra parte foi levada a cabo pelos militares da ala moderada, na qual se enquadrava Vasco Lourenço, Jaime Neves e Ramalho Eanes. A facção militar que acreditava na democracia parlamentar derrotou a que apostava no poder popular. Consequentemente, o almirante Pinheiro de Azevedo permaneceu no poder enquanto primeiro-ministro do VI Governo Provisório e demitiram-se alguns militares entre os quais Otelo Saraiva de Carvalho. O 25 de Novembro traduziu militarmente aquilo que a nível político se vivera no Verão Quente de 75 e encerrou o PREC - Processo Revolucionário em Curso e definiu o actual modelo político português.




Breve reflexão sobre o 25 de Novembro


Breve reflexão sobre o 25 de Novembro
Por Mário Soares
In, VISÃO

Passou na última quinta-feira o 35.º aniversário do 25 de Novembro de 1975. A maior parte dos leitores jovens desta breve crónica talvez não saiba sequer do que se trata. E, no entanto, é, na história contemporânea de Portugal, uma data tão importante, para a afirmação da democracia pluralista, pluripartidária e civilista que hoje temos, como a Revolução dos Cravos.
Não tenho nenhum gosto de levantar polémicas passadas. Mas a verdade é que a memória histórica não deve ser esquecida. Sobretudo, quando os responsáveis de termos estado à beira da guerra civil, o Partido Comunista e a Esquerda radical - lembremo-nos dos SUVs e do Poder Popular - nunca fizeram uma autocrítica a sério do seu comportamento passado, como lhes competia.
Pelo contrário, continuam a pensar - e às vezes a dizer - que o 25 de Novembro foi uma contrarrevolução que impediu que Portugal fosse uma Cuba europeia. Onde estariam hoje esses responsáveis - e os seus herdeiros - se tivessem ganho? Seguramente não viveriam tão bem e em paz como hoje, felizmente, vivem.
Depois disso, o mundo deu muitas voltas. Assistimos ao colapso do comunismo na URSS e nos Estados então satélites, como a queda do muro de Berlim, ao desaparecimento da cortina de ferro, ao fenómeno do terrorismo islâmico, à invasão do Afeganistão, com o aval da ONU e à guerra do Iraque - dois novos Vietnames -, à globalização económica e, sobretudo financeira, e à crise do capitalismo financeiro especulativo, dito de casino. Trata-se, como sabemos, de uma crise global e profunda, que nos atinge a todos, com maior ou menor incidência e que está longe de ter passado.
O mundo de hoje é muito diferente do de 1975. E a relação de forças internacionais mudou, com o aparecimento dos Estados emergentes. Tornou-se plurilateral e os blocos de Estados rivais pertencem ao passado. Quem nos diria que o Presidente da Rússia participaria numa Cimeira da NATO e tornava o seu país, um parceiro fiável do Ocidente? Quem nos diria que Fidel Castro, agora sem papas na língua, reconheceria que a experiência cubana fora - como se sabe - um tremendo fracasso?
Contudo, a nossa Esquerda, a comunista e a radical, parece terem passado por tudo isto sem darem por nada, sem interiorizar qualquer reflexão, continuando a repetir os mesmos slogans de sempre. É triste! Porque contribui para inquinar o nosso futuro, já de si difícil e extremamente complexo.
Diga-se, contudo, que o socialismo democrático também precisa de fazer uma séria autocrítica. E ainda não a fez. Pelo menos na Europa, onde se deixou influenciar pelo colonialismo ideológico neoliberal americano e pela fantasiosa "terceira via" de Blair, de que já poucos se lembram. Foi o que levou a maioria dos Estados europeus ao conservadorismo acéfalo, que hoje nos governa, e está a arrastar a União para a decadência e o descrédito.
É urgente, assim, que os europeus repensem a Esquerda e pressionem o Partido Socialista Europeu e a Internacional Socialista a mudar o paradigma de desenvolvimento, reafirmando a contrato social, os valores éticos e a necessidade tão atual de medidas ambientais. Sem isso - tenhamos a convicção - marchamos a passos rápidos para a desagregação da União Europeia. O que seria uma tragédia para os países membros da União, para a América e para o mundo.

Mário Soares (fundador do PS, ex-Primeiro-Ministro, de Julho de 1976 a Agosto de 78 e de Junho de 1983 a Novembro de 85 e ex-Presidente da República, de 1986-1996)
In, “VISÃO”, 1 de Dez de 2010